Tecnologia Utilizada na Construção das Muralhas de Elvas

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Acabada a descrição do perímetro amuralhado vamos perceber um pouco a sua técnica construtiva

“A necessidade é mestra de engenhos”, diz o ditado. E temos de concordar com esta afirmação no que diz respeito à arte de fortificar. As variadas guerras surgidas na Europa provocaram o desenvolvimento desta arte. Os anos de quinhentos e de seiscentos trouxeram grandes novidades na maneira de proteger e definir limites nas cidades europeias. A nova artilharia provocou um avanço na arquitectura militar, ou seja, ela teve de se renovar e adaptar às novas técnicas de balísticas surgidas com o uso da pólvora e das novas armas de fogo.

O aparecimento do baluarte em Itália no final do século XV veio revolucionar toda a arte de fortificar, sendo a primeira escola de fortificação a italiana. A influência desta escola em Portugal é notória durante todo o século XVI, temos como exemplo disso a Torre de Belém. No entanto, outras escolas surgiram, como a alemã, a francesa; mas é sob a influência da escola holandesa que as fortificações de Elvas se construíram. Esta técnica foi a preferida pelos portugueses no período anterior à Guerra da Restauração, num tempo em que a escola francesa era pouco conhecida.

Fossos largos para conter água e compensar os desníveis topográficos; a presença de taludes exteriores e de falsa braga para bater os fossos (a falsa braga nunca foi adoptada na fortificação de Elvas); no que diz respeito ao traçado, os flancos dos baluartes eram perpendiculares às cortinas formando ângulos de 90º; o escalonamento fazia-se em profundidade por 4 linhas: o caminho coberto, revelins, cobre-faces e contraguardas, a falsa braga, terminando no corpo da praça, eram as principais características da escola holandesa.

As fortificações eram construídas em terra e erigidas a partir das muralhas medievais já existentes. O facto dos flancos serem perpendiculares à cortina permitia atirar à esplanada e rasar a cortina do flanco. Uma 2ª linha de defesa era traçada a partir de um ponto da cortina permitindo defender as faces do baluarte a partir da cortina. Essa parte da cortina de onde era possível rasar a face do baluarte é chamada o segundo flanco. A construção de obras exteriores já era usual, no entanto na tradição holandesa o que difere é o modo como eram utilizadas em conjunto. Todas as obras eram estruturadas numa certa proporção, ou seja, as medidas e distâncias estavam relacionadas entre si. O ângulo saliente do baluarte era sempre de 90º; se fosse agudo podia minar-se o próprio ângulo e se fosse obtuso tornava-se um alvo fácil para a artilharia inimiga.

Podemos observar que Cosmander não utilizou todos os aspectos típicos da escola holandesa na construção da muralha elvense, talvez devido à topografia do terreno e às condições geográficas de Elvas. Vejamos então: a construção da falsa braga não foi necessária uma vez que o terreno é muito acidentado não havendo, por isso fogo em campo de tiro livre. A água nos fossos também não foi utilizada. No desenho da muralha elvense vimos que os ângulos de flanco são todos de 90º bem como o ângulo flanqueado, sendo excepção apenas o do Baluarte de Nª Srª da Conceição e do Casarão que têm ângulos mais agudos. O escalonamento é feito por três linhas: o caminho coberto, que em certos pontos tem apoio para artilharia, (talvez para compensar a ausência da falsa braga); várias obras exteriores como são os revelins, de apoio às portas e os revelins das praças d’armas entrincheiradas; vários contraguardas, redentes e cobre-faces; finaliza com o corpo da praça composto por vários baluartes e meios-baluartes e um redente. As várias frentes obtidas com a construção de Cosmander não têm um desenho regular, foram antes construídos em locais estratégicos e impostos pelas condições de terreno e orientação solar. A regularidade do desenho era usada para intimidar o inimigo, uma vez que causava indecisão no lado que deveria atacar, mas não se aplicou em Elvas.

A intenção era construir muralhas com uma função essencialmente defensiva e indestrutível por sua vez inexpugnável, associadas a uma simbologia de poder. Nesse sentido os baluartes concentravam a capacidade de fogo frontal e flanqueante, tinham uma acção atacante. As cortinas tinham um papel mais passivo, suportando as latrinas mas mantendo também um alinhamento de fogo defensivo. Serviam também para instalar as portas e poternas e por isso mesmo eram protegidas por revelins, tenalhas e horneveques, etc. Todos estes elementos são bem visíveis na muralha de Elvas. Todas as cortinas têm mais ou menos a meio uma latrina, bem como uma porta ou poterna protegidas por uma obra exterior. Os baluartes contêm várias peças de fogo viradas para as esplanadas; as cortinas também têm base de artilharia mas viradas para os flancos dos baluartes opostos (segundo flanco).

A aparência é austera e uniforme, todo o perímetro apresenta uma unidade formal: a construção é de pedra, todos os ângulos são protegidos por camisa em silharia de pedra e têm guarita. A escarpa está separada do merlões pelo cordão que rodeia toda a linha magistral. Três dos baluartes elvenses (Casarão, Praça de Armas e São João de Deus) apresentam cavaleiro, embora essa seja uma obra típica da escola alemã de fortificação. Depois do caminho coberto temos as esplanadas definidas em terra em campo aberto.

Ana Trigueiro
Licenciada em História – Ramo do Património Cultural

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