Ourique:Município contesta acção do MP que poderá implicar demolição de fábrica
O município de Ourique contestou ontem a acção interposta pelo Ministério Público (MP) para anular as decisões alegadamente ilegais da autarquia que permitiram construir uma fábrica no concelho e que poderá implicar a demolição da unidade.
No último dia do prazo previsto, a autarquia “entregou hoje, junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja, a contestação à acção administrativa especial interposta pelo MP”, disse à agência Lusa o presidente do município, Pedro do Carmo.
Questionado sobre os fundamentos invocados pela autarquia para contestar a acção, o autarca limitou-se a referir que “são esclarecedores” e que o município vai aguardar “com confiança e tranquilidade” a decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja, a quem competirá julgar ou arquivar o processo.
Após dois anos e quatro meses a apreciar uma participação apresentada em Março de 2006 por um membro do PSD na Assembleia Municipal de Ourique, o MP interpôs, dia 14 do último mês de Julho, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja, uma acção administrativa especial contra o município.
Através do julgamento da acção, o MP quer a anulação das decisões alegadamente ilegais do município de Ourique que permitiram construir uma fábrica no concelho e pede a reposição do estado anterior do terreno, o que implicaria o desmantelamento da unidade.
Trata-se da fábrica de transformação artesanal de porco alentejano Montaraz, de Garvão, instalada nesta freguesia rural de Ourique, fora do perímetro urbano e de uma área de loteamento industrial e num terreno classificado como área agrícola preferencial e com parte afecta à Reserva Agrícola Nacional (RAN).
A fábrica foi inaugurada pelo primeiro-ministro, José Sócrates, e começou a funcionar em Janeiro de 2007, após um investimento de 1,7 milhões de euros que já permitiu criar mais de 20 postos de trabalho directos e um volume de negócios de 600 mil euros no primeiro ano de actividade.
Segundo o despacho de acusação, ao qual a agência Lusa teve acesso, o MP pretende que os actos relativos ao licenciamento da construção da fábrica “sejam declarados nulos” e que “seja determinada a reposição total do terreno no estado em que se encontrava antes da construção da obra”, o que, na prática, implicará o desmantelamento da fábrica.
De acordo com o Plano Director Municipal (PDM) de Ourique, argumenta o MP, a fábrica devia “obrigatoriamente” ter sido construída “dentro do perímetro urbano e em área de loteamento industrial” e não no local actual, um terreno “classificado como área agrícola preferencial e com parte afecta à Reserva Agrícola Nacional (RAN)”.
O município devia ter elaborado um plano de pormenor necessário para transformar o terreno agrícola num espaço industrial (não previsto no PDM) e, desta forma, permitir a construção da fábrica no local, explica o MP.
No entanto, apesar de ter aprovado a sua elaboração, o município não elaborou o plano de pormenor, “entendendo erradamente ser já dispensável”, refere o MP, salientando que a falta do plano “comprometeu” a construção da fábrica num local que “não se enquadra no PDM em vigor”.
Por outro lado, frisa o MP, a aprovação da localização da fábrica pela Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR) do Alentejo foi emitida após a Câmara ter aprovado a elaboração do plano de pormenor que “nunca chegou a ser elaborado”.
O MP contesta e pede a anulação de um despacho e de duas deliberações do município que aprovaram o projecto de arquitectura, os projectos de especialidade e o licenciamento da construção da fábrica, alegando que “violam” o PDM de Ourique e o regime jurídico da RAN.
Em nota enviada à Lusa, Pedro do Carmo repudiou a “extemporaneidade” e a “falta de oportunidade” da acção, interposta “dois anos e quatro meses após o MP ter tomado conhecimento da participação” e “sabendo” que a fábrica “encontra-se em pleno funcionamento há muitos meses e é geradora de emprego e de riqueza no concelho”.
O autarca “estranha” que o MP, ao ter acesso aos autos do processo naquela altura, “não tenha promovido as medidas cautelares necessárias” para “suspender” os actos agora impugnados e, desta forma, impedir “em tempo útil” a construção da fábrica, “tal como estaria obrigado a fazer se fossem evidentes, manifestos ou prováveis os indícios de ilegalidade”.
Pedro do Carmo repudia também “a falta evidente de fundamentos sérios e consistentes da acção” e reforça a “certeza” de que os actos agora impugnados “são absolutamente legais”, porque, justifica, “a elaboração do plano de pormenor deixou de ser exigível com a entrada em vigor do actual regime jurídico da actividade industrial” no decorrer do processo de licenciamento da fábrica.
“Estamos tranquilos, porque a fábrica foi construída dentro da legalidade”, disse à Lusa o administrador da Montaraz de Garvão, Manuel Falcão, referindo que a empresa vai aguardar “com serenidade” a decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja.
O responsável mostrou-se também “admirado” pela acção do MP ter sido interposta “fora de tempo”, lembrando que a fábrica, o “segundo maior empregador privado no concelho de Ourique”, já está a funcionar há um ano e meio.
LL.
Lusa/Tudoben