Casa Pia: Ministério Público reforça consistência de depoimentos de vítimas

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O Ministério Público (MP) tentou hoje reforçar a credibilidade dos depoimentos das vítimas do processo Casa Pia, que alegaram ter sido abusados numa casa em Elvas, e simultaneamente desmontar os álibis dos vários arguidos que negam lá ter estado.

    No quinto dia de alegações finais do MP, o procurador João Aibéo citou a juíza da fase de instrução do processo para frisar que “falta espontaneidade” aos álibis invocados pelos arguidos, à excepção de Carlos Silvino, para provarem que não estiveram em Elvas nos dias dos alegados abusos recorrendo a recibos bancários, registo de utilização de cartões, telemóveis e comprovativos de passagem na Via Verde.

    Em relação a Carlos Cruz, Aibéo afirmou que guiava depressa e “ir e vir a Elvas podia ser uma coisa rapidíssima” para o apresentador, dando como exemplo uma viagem entre Carcavelos e o Algarve que o apresentador fez “em duas horas”.

    Quanto ao médico Ferreira Diniz e aos seus álibis, afirmou que os programas de rádio que este disse ter gravado na Rádio Renascença, em Lisboa, podiam ter sido enviados “por telefone” em datas que as vítimas apontaram como dias em que foram abusados, podendo assim ter estado em Elvas.

    Em relação a Hugo Marçal, desvalorizou recibos de depósitos bancários por este apresentados, lembrando que a ex-mulher do advogado admitiu em tribunal que “falsificava a assinatura” do marido.

    O facto de não aparecer registo de contactos entre os arguidos através dos seus telemóveis habituais não significa que não tenham falado, porque podiam “comprar cartões pré-pagos, sem o nome do titular” para comunicarem entre si e combinar eventuais encontros em Elvas, acrescentou.

    Durante toda a sessão da manhã, o procurador do MP insistiu em credibilizar os testemunhos dos jovens e as descrições que fizeram da casa de Elvas, apesar de algumas inconsistências entre o que relataram e a arquitectura da casa, destacando mesmo que foi “modificada substancialmente” em data não apurada, sem licenciamento camarário e à revelia do projecto.

    João Aibéo referiu um “croquis” da casa de Elvas feito por um dos jovens, afirmando que “representa inequivocamente” aquele local e que foi feito antes mesmo de a Polícia Judiciária ter feito buscas no imóvel e a planta ter sido junta ao processo.

    “Houve mais do que tempo para fazer essas alterações e confundir os assistentes”, disse Aibéo, destacando que o tribunal não pode descurar a possibilidade de ter havido obras no local do crime.

    Face ao registo vídeo do reconhecimento feito pelas vítimas no local, o procurador sustentou que “só não vê quem não quer” que os jovens conheciam a casa e identificaram imediatamente as salas onde dizem ter sido abusados por Carlos Cruz, Ferreira Diniz, Hugo Marçal, o ex-provedor-adjunto Manuel Abrantes e o embaixador Jorge Ritto, entre outras figuras, algumas já ilibadas deste processo.

    Segundo João Aibéo, uma das estratégias das defesas dos arguidos foi procurar criar a ideia de que o sítio onde ocorreram abusos em Elvas seria outro e os abusadores também seriam outros, tendo rejeitado liminarmente esta tese de uma segunda casa naquela cidade.

    “Quem levava os miúdos era o senhor Carlos Silvino”, disse, referindo-se ao ex-motorista da Casa Pia de Lisboa, que confirma ter estado em Elvas, embora durante o julgamento tenha sido “contraditório”, alegando que apenas dava boleia aos jovens casapianos.

    Aibéo estranhou a “passividade” e criticou a atitude de Manuel Abrantes, que foi instrutor de vários processos disciplinares internos da Casa Pia relacionados com abusos de Silvino a alunos, e que depois veio dizer que desconhecia os comportamentos do ex-motorista.

    “Não se traz aqui uma única palavra de indignação. Manuel Abrantes tem medo de Carlos Silvino, sabe que ele sabe mais sobre ele do que aqui revelou”, disse.

    No final da sessão da manhã, Manuel Gonçalves, advogado de Gertrudes Nunes, dona da casa de Elvas, considerou que tudo o que foi dito hoje foi “uma reprise” de um espectáculo de teatro levado à cena há alguns anos em Lisboa e que tinha “um título engraçado”, que era “Vamos Contar Mentiras”.

   

    APN/AMN/FC.

    Lusa/Tudoben

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